‘The Last of Us 2’: ‘Reviravolta na trama mata a alma da série’, diz crítico da BBC
Crédito, Liane Hentscher/HBO
- Author, Caryn James
- Role, BBC Culture
Apesar de todas as criaturas com o cérebro infectado por um fungo que ficam vagando na série, The Last of Us nunca foi realmente sobre zumbis.
A primeira temporada funcionou tão bem por causa do vínculo cada vez mais forte entre os protagonistas Joel e Ellie, a adolescente órfã que ele foi contratado para levar até o outro lado do país, e que acabou se tornando sua filha postiça.
Os zumbis acrescentaram perigo, suspense e ação, mas o ponto forte da série foi a representação profunda de como o amor sobrevive mesmo em um apocalipse zumbi, com Joel e Ellie como uma família recém-criada.
Na segunda temporada da série da HBO, que começou a ser exibida no domingo (13/04), há uma reviravolta drástica na trama — a mais surpreendente de uma série de sucesso de que me lembro —, uma guinada impressionante demais para dar spoiler.
Desestruturar uma série de sucesso pode funcionar de forma brilhante, como aconteceu quando O Urso substituiu a lanchonete da primeira temporada por um restaurante requintado na segunda. Mas a grande mudança em The Last of Us é uma escolha criativa devastadora.
Ainda há pontos altos e momentos emocionantes. Pedro Pascal mantém uma atuação carismática e comovente como Joel, permitindo que vejamos tanto o sobrevivente calejado quanto a ternura que persiste. E Bella Ramsey ainda define com precisão a obstinada Ellie. Mas a reviravolta na trama mata a alma da série, oferecendo uma versão diminuta do grande entretenimento que já foi.
Mas a nova temporada começa com força, retomando a história cinco anos depois do ponto em que foi interrompida. Joel e Ellie estão agora estabelecidos em Jackson, no Estado americano de Wyoming, e os primeiros episódios evocam suavemente a sensação de um velho faroeste.
A cidade é cercada por muralhas fortificadas, e carroças puxadas por cavalos circulam pelas ruas principais. Cidadãos a cavalo, incluindo Joel e Ellie, patrulham a área fora dos portões em busca de infectados.
Embora Ellie more na garagem da casa de Joel, ela está furiosa com ele, e a série leva um tempo para explicar o motivo. Você pode achar que já sabe. No final da última temporada, ele a tirou de uma mesa de cirurgia onde os cirurgiões poderiam ter usado a imunidade dela para curar a infecção pelo fungo que gerou a pandemia, mas certamente teriam causado sua morte. (É uma série de televisão, não científica). Ele matou pessoas para escapar, e mentiu para ela sobre isso. Acontece que este não é o único motivo da raiva dela.
Crédito, Liane Hentscher/HBO
Ao redor deles, alguns atores fascinantes dão vida à cidade de Jackson. O irmão leal de Joel, Tommy (Gabriel Luna), é mais central nesta temporada. No papel de Gail, a terapeuta irreverente da cidade, Catherine O’Hara harmoniza delicadamente algumas falas mordazes com o luto de Gail pela perda do marido. Isabela Merced está especialmente pujante como a enérgica Dina, que acabou de terminar com o namorado, Jesse (Young Mazino). Não se pode culpar Merced, uma vez que os roteiristas sugerem o possível romance de Dina com Ellie desde o início.
A cena mais emocionante e cheia de ação também acontece logo no início, quando hordas de infectados invadem as barricadas de Jackson, enquanto os habitantes da cidade efetuam disparos dos telhados.
Mas o perigo também vem de outros lugares. Kaitlyn Dever interpreta Abby, uma nova personagem implacável à procura de Joel, que jura vingança pelo ataque no hospital. Assim como a primeira temporada, a segunda também mostra uma sociedade em que matar assume um significado moral diferente e até mesmo os entes queridos infectados precisam ser mortos.
Abby é apenas uma das personagens que está enfrentando essas questões: quando matar é aceitável nesse mundo pós-apocalíptico? Como as pessoas separam vingança e justiça? Este ainda é um tema instigante.
Mas a história logo perde o rumo quando envia Ellie e Dina para longe de Jackson em uma viagem de carro perigosa. Cena após cena, os ataques de zumbis podem ser angustiantes. As criaturas parecem repugnantes, com cérebros saindo de suas cabeças enquanto saltam das sombras em porões escuros. Mas agora os ataques são muito regulares e previsíveis.
E, por mais que você esteja torcendo para que Ellie e Dina reconheçam a atração que sentem, elas passam tanto tempo se esquivando dos infectados — como se matar zumbis fosse realmente o objetivo da série —, que o relacionamento delas não é páreo para o de Joel e Ellie. Um episódio de flashback sobre o que aconteceu com Joel e Ellie nos cinco anos entre as temporadas é eloquente, e está entre os melhores da nova safra. Mas também revela o quanto a série depende da dinâmica entre eles.
O público de The Last of Us sempre foi dividido entre espectadores que conhecem o videogame no qual se baseia (um grupo menos propenso a se chocar com as reviravoltas), e aqueles que não conhecem ou não se importam com isso. Mas o game não pode ser tratado como um texto sagrado se quiser funcionar como televisão, e a primeira temporada o transformou brilhantemente em uma série centrada nos personagens.
Com seu drama emocional disperso, a segunda temporada muitas vezes parece banal, mais uma série derivada de um game que pode deixar boa parte do público indiferente.