Quem são os drusos e por que Israel diz que ‘não vai tolerar qualquer ameaça’ a eles na Síria
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- Author, Serviços árabe e turco da BBC News
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Uma nova onda de violência sectária abalou a Síria, colocando em evidência a frágil situação de segurança do país, enquanto o novo governo tenta impor sua autoridade sobre o território fragmentado.
No domingo (13/7), o suposto sequestro de um comerciante da minoria drusa desencadeou confrontos mortais entre milícias drusas e combatentes beduínos sunitas no sul do país.
Dois dias depois, Israel interveio militarmente, afirmando que suas forças buscavam proteger os drusos e eliminar as forças pró-governo acusadas de atacá-los em Sweida.
De acordo com o Observatório Sírio para os Direitos Humanos, pelo menos 300 pessoas foram mortas em Sweida desde domingo.
Este é o mais recente episódio de violência no país desde que os confrontos de abril e maio entre combatentes drusos e as novas forças de segurança da Síria deixaram dezenas de mortos.
Tudo isso reacendeu os temores de um colapso da segurança na Síria, à medida que o país enfrenta as consequências de mais de uma década de guerra civil, e da recente tomada de poder por rebeldes islâmicos, em dezembro de 2024.
O atual líder da Síria, o ex-jihadista Ahmed al-Sharaa, prometeu proteger as minorias.
Mas muitas comunidades minoritárias, incluindo os drusos, desconfiam da sua promessa.
Nos últimos dias, Israel afirmou ter bombardeado forças do governo sírio nos arredores de Sweida, que teriam sido enviadas à província para deter confrontos sectários.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse que havia ordenado ataques a depósitos de armas porque o governo sírio “pretendia usá-las contra os drusos”.
Já no início deste ano, Netanyahu alertou que não toleraria qualquer ameaça contra esta comunidade.
A Síria condenou a intervenção de Israel.
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Quem são os drusos?
O povo druso é uma comunidade étnica e religiosa de língua árabe com crenças e práticas próprias, cuja fé se originou como uma ramificação do islamismo xiita.
Embora sejam conhecidos como drusos, eles se autodenominam al Muwahhidun, que significa “o povo da unidade”. Sua fé se baseia na ideia de que Deus é incognoscível, indescritível e absoluto.
Considerada uma das comunidades mais antigas do Oriente Médio, os drusos conseguiram preservar sua presença por séculos.
Ninguém pode se converter à sua fé, e aqueles que a abandonam nunca mais podem retornar. Também é proibido se casar com alguém de fora da comunidade.
Eles possuem textos sagrados, mas o acesso a eles é restrito, e apenas um pequeno número de drusos considerados espiritualmente elevados tem permissão para participar de rituais religiosos.
Eles não têm permissão para compartilhar detalhes de suas crenças ou práticas religiosas. Por esse motivo, são frequentemente considerados uma comunidade misteriosa.
Cultural, linguística e etnicamente, eles são considerados árabes. Mas a maioria dos drusos se identifica primeiro como druso, e depois como árabe.
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Onde eles vivem?
Há aproximadamente 1,5 milhão de drusos em todo o mundo, e sua comunidade está distribuída principalmente em quatro países: Síria, Líbano, Israel e Jordânia.
Quase metade da população drusa, aproximadamente 700 mil pessoas, vive na Síria. Seu principal reduto é Sweida, uma província ao sul de Damasco. Esta região, conhecida antigamente como Jabal al Druze (“a montanha dos drusos”), ainda é considerada o coração da identidade drusa.
Em 1923, uma fronteira traçada pelo Reino Unido e pela França dividiu o sopé desta montanha. Os drusos que viviam ao sul de Sweida permaneceram no lado jordaniano. Atualmente, cerca de 30 mil drusos vivem nas zonas rurais ao redor da capital, Amã.
O Líbano abriga a segunda maior população drusa, depois da Síria, com aproximadamente 300 mil pessoas. Eles vivem principalmente nas montanhas de Chouf, na região de Metn e no Vale de Teym. No Líbano, os drusos são oficialmente reconhecidos como uma seita religiosa, com assentos designados no Parlamento.
Para os drusos, 1967 foi outro momento de virada. Naquele ano, Israel ocupou a região das Colinas de Golã, que pertencia à Síria. A comunidade drusa na região foi dividida da noite para o dia: alguns permaneceram no lado sírio, enquanto outros ficaram sob controle israelense.
Atualmente, a maioria dos drusos que vivem nos vilarejos ocupados ainda tem um senso de identificação com a Síria.
Em todo o território de Israel, incluindo as Colinas de Golã, existem aproximadamente 150 mil drusos. Os drusos são o único grupo árabe em Israel sujeito ao serviço militar obrigatório.
Os drusos na Síria
Sob o governo do presidente Bashar al-Assad, agora deposto, muitos drusos mantiveram uma lealdade silenciosa ao Estado, na esperança de que isso os protegesse do derramamento de sangue sectário que devastou outras partes da Síria durante os 13 anos de guerra civil.
A maior parte da comunidade não se juntou às fileiras da oposição ao regime, à medida que tentava se distanciar do conflito interno.
Mas, em 2015, batalhões islâmicos liderados pelo grupo Jabhat al-Nusra avançaram em partes de Daraa e das Colinas de Golã, e ameaçaram o aeroporto militar de Thaala, controlado pelo governo, na província de Sweida, e vários drusos lutaram ao lado das forças do regime.
Eles operavam sua própria milícia, que defendia suas áreas contra ataques de grupos extremistas muçulmanos sunitas que consideravam os drusos hereges, enquanto as forças pró-Assad os deixavam em paz.
Mas com a derrubada do presidente por rebeldes islâmicos sunitas, que formaram o governo interino, esse pacto tácito se desfez, e os drusos agora temem ficar isolados e se tornar alvo de ataques na Síria do pós-guerra.
Os recentes ataques contra comunidades drusas por parte de milícias islâmicas vagamente afiliadas ao governo de Damasco alimentaram a crescente desconfiança em relação ao Estado.
A nova autoridade é composta em sua maioria por membros do Hay’at Tahrir al-Sham (HTS), o mesmo grupo que atacou Sweida, quando se chamava Jabhat al-Nusra, sob a liderança de Ahmad al-Shara, conhecido na época como Abu Mohammed al-Jawlani.
Durante anos de conflito, os drusos formaram facções armadas locais para proteger seus vilarejos e regiões. Estes combatentes armados controlam Sweida.
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Os ataques recentes
Os confrontos começaram no fim de abril com o vazamento de uma gravação de áudio em que supostamente se escutava um líder religioso druso insultando o profeta Maomé.
Embora o líder tenha negado que fosse sua voz, e o Ministério do Interior da Síria tenha posteriormente confirmado que a gravação era falsa, o dano já estava feito: provocou uma onda de violência sectária em comunidades por todo o país.
Desde então, o governo sírio afirmou que suas forças de segurança realizaram diversas operações para restaurar a segurança e a estabilidade.
Enquanto isso, o Exército de Israel disse que havia atacado vários tanques do governo para impedir que avançassem em direção à cidade de Sweida.
O ministro da Defesa israelense, Israel Katz, declarou que os ataques eram um “aviso claro ao regime sírio”.