Papa Leão 14: quem é Robert Prevost, 1º pontífice americano e defensor do legado de Francisco
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- Author, Paul Kirby
- Role, BBC News
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Antes mesmo de seu nome ser anunciado na sacada da Basílica de São Pedro, a multidão abaixo gritava “Viva il papa” (Viva o papa).
Ele será o primeiro americano a ocupar o posto de papa, embora também seja considerado um cardeal latino-americano devido aos muitos anos que passou como missionário no Peru, antes de se tornar arcebispo.
Leão 14 disse à multidão que o ouvia na Basílica de São Pedro que é membro da Ordem Agostiniana, a primeira da Igreja Católica Romana a combinar a posição clerical com uma vida comunitária plena. A ênfase moderna tem sido na missão, na educação e no trabalho hospitalar.
Na juventude, ele frequentou um seminário da Ordem de Santo Agostinho em St. Louis antes de se formar em matemática na Filadélfia.
Leão 14 tinha 30 anos quando se mudou para o Peru justamente como parte de uma missão agostiniana.
Poliglota, ele tem nacionalidade peruana e é lembrado com carinho como uma figura que trabalhou com comunidades marginalizadas e ajudou a construir pontes na Igreja local.
Nascido em Chicago em 1955, Prevost é filho de mãe espanhola e pai americano, Tem dois irmãos, Louis Martín e John Joseph.
Ele serviu com coroinha e passou a infância e a adolescência como estudante no Seminário Menor dos Padres Agostinianos, em sua cidade natal, e mais tarde na Universidade Villanova, na Pensilvânia, onde estudou matemática.
Aos 22 anos, ingressou no noviciado da Ordem de Santo Agostinho de São Luís e se formou em Teologia. Foi ordenado sacerdote em 1982.
Ele foi então enviado para Roma, onde estudou direito canônico. Em 1987, obteve seu doutorado e nesse mesmo ano foi eleito diretor de vocações e diretor de missões da província agostiniana “Mãe do Bom Conselho” em Illinois, Estados Unidos.
Embora tenha se mudado para o Peru três anos depois, ele retornava regularmente aos Estados Unidos para servir como pároco e prior em sua cidade natal.
Ao retornar a Chicago em 1999, foi nomeado prior provincial dos agostinianos naquela região americana e, posteriormente, prior geral da ordem em todo o mundo.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, parabenizou o novo papa em sua plataforma Truth Social.
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O papa Francisco, de quem era muito próximo, o levou para Roma em 2023 para chefiar o Dicastério, um dos escritórios mais influentes da Cúria, responsável pela seleção da próxima geração de bispos.
Isso o tornou bem conhecido pelos cardeais de toda a América Latina.
No mesmo ano, ele o nomeou cardeal e lhe atribuiu a igreja romana de Santa Mônica.
Em fevereiro de 2025, ele foi promovido a Cardeal-Bispo de Albano, uma das sedes suburbicárias de Roma, reservada aos membros de mais alto escalão do Colégio Cardinalício.
Ele também foi até agora presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina.
Como 80% dos cardeais que participaram do conclave foram nomeados por Francisco, não é de se surpreender que alguém como Prevost tenha sido eleito.
Dos cardeais americanos, ele era visto como o que tinha mais chances de se tornar papa devido à sua inclinação pastoral, perspectiva global e capacidade de governar a Cúria Romana, segundo os especialistas.
Mas, ao mesmo tempo, sua sólida formação em direito canônico tranquilizava os círculos da Igreja que buscam uma abordagem mais focada na teologia.
Como cardeal, ele não hesitou em contestar as opiniões do vice-presidente dos EUA, J.D. Vance.
Ele republicou numa rede social X uma postagem crítica à deportação de um residente americano para El Salvador, realizada pelo governo Trump, e compartilhou um artigo de opinião crítico a uma entrevista concedida por Vance à Fox News.
“J.D. Vance está equivocado: Jesus não nos pede para hierarquizar nosso amor pelos outros”, dizia a postagem, repetindo a manchete do comentário no site National Catholic Reporter.
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Leão 14 é considerado um reformista e visto como uma figura que favorece a continuidade das mudanças que Francisco promoveu na Igreja Católica.
Acredita-se que Prevost compartilhasse as visões de Francisco sobre migrantes, os pobres e o meio ambiente.
Após a morte de Francisco, ele disse em uma entrevista que ainda havia “muito a fazer” na transformação da Igreja: “Não podemos parar, não podemos retroceder. Temos que ver como o Espírito Santo quer que a Igreja seja hoje e amanhã, porque o mundo de hoje, em que a Igreja vive, não é o mesmo que o mundo de 10 ou 20 anos atrás”.
Embora seja americano e esteja plenamente ciente das divisões dentro da Igreja Católica, sua origem latino-americana também representa a continuidade de um papa que veio da Argentina.
O reverendo Mark Francis, amigo de Prevost desde a década de 1970, disse à Reuters que o cardeal era um firme defensor do papado de seu antecessor e, em particular, do compromisso do falecido pontífice com a justiça social.
“Ele sempre foi gentil e afetuoso, e continuou sendo uma voz de bom senso e preocupação prática com o trabalho da Igreja em prol dos pobres”, disse Francis, que frequentou o seminário com Prevost e mais tarde o conheceu quando ambos moravam em Roma nos anos 2000.
“Ele tinha um senso de humor irônico, mas não buscava os holofotes”, acrescentou Francis.
Antes do conclave, o porta-voz do Vaticano, Matteo Bruni, disse que, durante as reuniões do Colégio Cardinalício nos dias que antecederam o conclave, foi enfatizada a necessidade de um papa com “um espírito profético capaz de liderar uma Igreja que não se fecha em si mesma, mas sabe como sair e trazer luz a um mundo marcado pelo desespero”.
Em suas primeiras palavras como papa, Leão 14 falou com carinho de seu antecessor, diante das mais de 40 mil pessoas presentes ali na Praça de São Pedro.
“Ainda ouvimos em nossos ouvidos a voz fraca, mas sempre corajosa, do papa Francisco, que nos abençoou”, disse ele.
“Unidos e de mãos dadas com Deus, avancemos juntos”, afirmou diante de uma multidão em festa.
“A humanidade precisa de Cristo como ponte para ser alcançada por Deus e seu amor. Ajudem-nos e ajudem-nos uns aos outros a construir pontes.”
O novo papa mudou então do italiano para o espanhol para agradecer à sua antiga diocese no Peru, “onde um povo leal compartilhou sua fé e doou muito”.
Leão 14 também insistiu na necessidade de unidade e, no final de seu discurso, convidou todos a se unirem em oração.
Ele tem nacionalidade peruana desde 2015, tendo passado grande parte de sua vida religiosa no país andino.
Durante seus anos no Peru, atuou como pároco, professor de seminário, prefeito de estudos, juiz eclesiástico e membro do conselho consultivo da Diocese de Trujillo, além de dirigir o seminário agostiniano naquela cidade por uma década.
Ele foi membro da Conferência Episcopal Peruana (CEP) de 2018 a 2023, atuando como segundo vice-presidente, e atuou como administrador apostólico de Callao de 2020 a 2021.
Em 2014, foi nomeado bispo de Chiclayo, cargo que ocupou até sua transferência definitiva para o Vaticano, em 2023.
Embora, durante seu mandato como arcebispo no Peru, ele não tenha escapado dos escândalos de abuso sexual que obscureceram a Igreja, sua diocese negou veementemente que ele tenha se envolvido em qualquer tentativa de encobrimento.
Em seu primeiro discurso como papa, Leão 14 disse em espanhol: “Uma saudação especial à minha amada diocese de Chiclayo, no Peru, onde um povo fiel acompanhou seu bispo, compartilhou sua fé e deu muito, muito, para continuar sendo a Igreja fiel de Jesus Cristo”.
Jesús León Ángeles, coordenador de um grupo católico em Chiclayo que conhece Prevost desde 2018, o descreveu como uma pessoa “muito humilde” que se esforçava para ajudar os outros.
León Ángeles enfatizou que Prevost demonstrou preocupação especial com os imigrantes venezuelanos no Peru.
A presidente peruana Dina Boluarte descreveu a eleição do primeiro papa com nacionalidade peruana como “um momento histórico para o Peru e o mundo”.
Boluarte afirmou que o novo Papa era “um cidadão peruano por escolha e de coração”.
“Ele escolheu ser um de nós, viver entre nós e carregar a fé e a cultura desta nação em seu coração”, disse ele.
Um conclave rápido
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Um total de 133 cardeais, todos com menos de 80 anos, se reuniram na Cidade do Vaticano, um Estado independente no coração de Roma, para eleger o 267º Papa.
Para escolher o novo pontífice, os diferentes grupos de cardeais — cada um com seus interesses particulares — tiveram que formar alianças e acordos ao longo do processo, chamado de conclave.
Pela primeira vez, cardeais de lugares da “periferia”, como Francisco os chamou, fizeram parte do conclave, então representantes de lugares como Mongólia, Papua Nova Guiné, Paquistão, China e Ruanda votaram.
Dois terços dos eleitores deviam concordar com o mesmo nome para que o papa fosse eleito.
Após a decisão, a fumaça branca subiu da chaminé da Capela Sistina para anunciar que há um novo Papa, e ele foi questionado se aceita o cargo e qual nome deseja adotar.
Desta vez, os cardeais tomaram a decisão em um único dia e após apenas quatro rodadas de votação, o que é considerado relativamente rápido em comparação a ocasiões anteriores.
“É um sinal claro da unidade da Igreja”, disse o cardeal italiano Giuseppe Versaldi na sala de imprensa do Vaticano.
Enquanto a fumaça branca subia e os sinos tocavam alto, os fiéis na Praça de São Pedro, no Vaticano, irromperam em aplausos e vivas.
Muitos dos que estavam ali se abraçaram e agitaram bandeiras de diferentes países ao redor do mundo.