Lei Magnitsky contra Moraes é busca por impunidade de ‘aliados próximos’ de Trump, diz ONG americana
Crédito, Getty Images
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- Author, Luiz Fernando Toledo
- Role, Da BBC News Brasil, em Londres*
A sanção ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes pela Lei Global Magnitsky, anunciada nesta quarta-feira (30/07) pelo governo americano serviu “principalmente para destacar a busca do governo de Donald Trump pela impunidade de aliados políticos.”
A afirmação é da Humans Rights First, organização sediada nos Estados Unidos de proteção de direitos humanos criada em 1978.
O governo americano justificou a medida afirmando que o ministro seria responsável por “uma campanha opressiva de censura, detenções arbitrárias que violam os direitos humanos e processos politizados, inclusive contra o ex-presidente Jair Bolsonaro”.
“As sanções contra Moraes parecem se basear, pelo menos em parte, na visão contestada de que brasileiros investigados ou processados por ações relacionadas ao ataque de janeiro de 2023 às instituições governamentais brasileiras estão, na verdade, sendo detidos arbitrariamente por liberdade de expressão”, diz a organização, em nota publicada em seu site.
Bolsonaro é réu no processo que tramita no STF por tentativa de golpe de Estado. Está usando tornozeleira eletrônica e está impedido de usar redes sociais.
Para a ONG, especializada na Lei Magnitsky, a preocupação americana com o processo de Bolsonaro seria mais crível “se fosse evidente em outros contextos, ou acompanhada de ações para lidar com abusos muito mais graves contra repórteres do que os alegados.” Destacou, por exemplo, a crescente crise de jornalistas que são mortos por seu trabalho, tanto na América Latina quanto pelo Oriente Médio.
A ONG diz que essa foi a primeira aplicação da lei nesta gestão de Trump. “E esta primeira ação parece ter como objetivo mais acabar com a responsabilização do que em promovê-la”, diz Adam Keith, diretor sênior de responsabilização da Human Rights First.
Ele destacou que no primeiro mandato de Trump e no do sucessor, Joe Biden, a lei tinha sido usada para promover responsabilização por corrupção no Congo, por execuções extrajudiciais cometidas por forças de segurança em Bangladesh e pela condenação de ativistas de direitos humanos na Rússia à prisão por décadas.
“O anúncio não continha qualquer indício de apoio à responsabilização pelo ataque de 2023 às instituições democráticas do Brasil — o que não é surpresa, já que o presidente Trump deixou claro que está disposto a iniciar uma guerra comercial e outras medidas extremas para proteger o ex-presidente Jair Bolsonaro do escrutínio a esse respeito”, disse ele.
Para a ONG, o governo americano está incorporando à política externa dos EUA a noção de que qualquer esforço de responsabilização que afete aliados políticos de Trump deve ser descreditado e interrompido.
A organização destacou ainda que o Departamento de Estado teria violado a lei ao anunciar nominalmente que negaria a entrada de Moraes nos EUA, já que tradicionalmente as decisões de visto são tidas como sigilosas.
A BBC News Brasil procurou o órgão para que se manifestasse sobre a afirmação, mas ainda não obteve retorno até a publicação deste texto.
O que é a Lei Magnitsky e como ela pode afetar Moraes?
Aprovada durante o governo de Barack Obama, em 2012, a Lei Magnitsky foi criada para punir autoridades russas envolvidas na morte do advogado Sergei Magnitsky, que denunciou um esquema de corrupção estatal e morreu sob custódia em Moscou.
Há três consequências principais para quem é colocado na lista de sancionados pela legislação: proibição de viagem aos EUA, congelamento de bens nos EUA e proibição de qualquer pessoa ou empresa nos EUA de realizar transações econômicas com o indivíduo penalizado. Os efeitos disso no Brasil ainda não são claros.
Moraes já estava impedido de entrar em território americano. O secretário de Estado americano, Marco Rubio, já havia anunciado, em 18 de julho, a revogação do visto do ministro, seus familiares e “aliados” — sem detalhar quem são esses.
O último ponto previsto pela lei, que trata das transações financeiras, é o que costuma causar maiores problemas às pessoas sancionadas pelos EUA, afirmou Natalia Kubesch, advogada da Redress — entidade britânica que ajuda vítimas de tortura e abusos de direitos humanos em diversas partes do mundo — em entrevista à BBC News Brasil.
Para EUA, Moraes é ‘juiz ativista’ e um ‘ator estrangeiro maligno’
O departamento de Estado do governo americano disse na quinta-feira (31/7) que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes é um “juiz ativista” e um “ator estrangeiro maligno” que abusa de sua posição de autoridade para minar a liberdade de expressão de cidadãos americanos.
O governo americano não descartou novas sanções contra brasileiros — mas também não deu nenhum indício concreto sobre novas medidas.
As declarações foram dadas por Tommy Pigott, porta-voz do secretário de Estado Marco Rubio, durante uma entrevista a jornalistas em Washington.
“Em 31 de julho, o secretário Rubio anunciou sanções americanas contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que usou seu cargo para autorizar prisões preventivas arbitrárias e minar a liberdade de expressão”, disse Pigott.
“Moraes abusou de sua autoridade ao se engajar em um esforço politicamente motivado para silenciar críticos políticos com a emissão de ordens secretas, obrigando plataformas online — incluindo empresas de mídia social americanas — a banir indivíduos por postarem discursos protegidos [pelo direito à liberdade de expressão].”
*com informações de Julia Braun e Daniel Gallas