‘Guerra ao Airbnb’: a ofensiva do governo da Espanha contra aluguel turístico em meio a crise de moradia
Crédito, Getty Images
- Author, Guy Hedgecoe
- Role, Da BBC News, em Madri
A Espanha solicitou a remoção de quase 66 mil imóveis da plataforma Airbnb por descumprirem as normas para hospedagem turística.
A medida ocorre em meio ao aumento dos protestos contra o turismo em excesso, às vésperas da alta temporada. No domingo (18/5), manifestações nas Ilhas Canárias reuniram milhares de pessoas.
O ministro dos Direitos Sociais, Defesa do Consumidor e Agenda 2030, Pablo Bustinduy, afirmou que os imóveis em questão “violaram diversas normas relacionadas à habitação de uso turístico”.
O anúncio veio após uma decisão judicial em Madri que determinou a retirada imediata de 4.984 imóveis do Airbnb citados pelo ministério.
As propriedades estão localizadas em seis regiões: Madri, Andaluzia, Catalunha, Comunidade Valenciana, País Basco e Ilhas Baleares.
O ministério de Bustinduy aguarda agora decisões judiciais sobre os cerca de 60 mil demais imóveis sob suspeita de descumprir regras.
Segundo o governo espanhol, os anúncios questionados não apresentaram número de licença, informaram dados incorretos ou não especificaram o status legal do proprietário — o que permitiria saber se o aluguel era feito de forma profissional ou como pessoa física.
Bustinduy classificou a decisão judicial como “uma vitória clara para quem luta pelo direito à moradia”.
Ele acrescentou que “é possível garantir que nenhum interesse econômico se sobreponha à moradia e que nenhuma empresa, por maior ou mais poderosa que seja, esteja acima da lei”.
Crise de moradia
A questão da habitação tem se tornado a principal preocupação dos espanhóis nos últimos meses, diante da disparada dos preços dos aluguéis, sobretudo nas grandes cidades.
O valor médio do aluguel duplicou na última década, enquanto os salários não acompanharam o aumento.
Muitos veem os imóveis turísticos como uma das principais causas do problema, já que reduzem a oferta de moradia para os residentes locais.
A Espanha é o segundo destino turístico mais visitado do mundo, atrás apenas da França. Em 2024, o país recebeu 94 milhões de visitantes estrangeiros — aumento de 13% em relação ao ano anterior.
No início do ano, o primeiro-ministro socialista Pedro Sánchez declarou: “Há Airbnbs demais e moradias de menos” e prometeu conter a expansão “descontrolada” do uso de imóveis para turismo.
Crédito, Getty Images
Alguns governos locais também começaram a agir contra o Airbnb.
A prefeitura de Barcelona anunciou que eliminará os 10 mil apartamentos turísticos de curto prazo até o fim de 2028.
Outras cidades adotaram uma abordagem diferente. Nos últimos meses, o Airbnb firmou acordos com autoridades locais nas Ilhas Canárias, Ibiza e Múrcia para garantir que os proprietários cumpram as regras de locação turística.
A empresa respondeu à decisão judicial e às declarações de Bustinduy afirmando que vai recorrer das decisões relacionadas ao caso e que não foram apresentadas evidências de irregularidades cometidas pelos anfitriões.
A plataforma também citou uma decisão da Suprema Corte da Espanha, de 2022, que determinou que a responsabilidade pelas informações nos anúncios é do anfitrião de cada imóvel, e não do Airbnb, considerado um “intermediário neutro” e não uma empresa imobiliária.
O Airbnb também fez uma crítica mais ampla à política de habitação da Espanha.
“A causa raiz da crise de moradia acessível na Espanha é a falta de oferta para atender à demanda”, disse um porta-voz.
“Governos ao redor do mundo estão percebendo que regular o Airbnb não resolve o problema nem devolve casas ao mercado — apenas prejudica famílias locais que dependem do aluguel por temporada para pagar suas contas e lidar com o aumento do custo de vida.”
No verão passado, a Espanha viveu uma onda de protestos contra o turismo em excesso em diversos destinos populares, sendo o impacto na moradia a principal queixa.
Com o número de visitantes estrangeiros se aproximando rapidamente dos 100 milhões por ano, espera-se que os protestos continuem neste verão.
No domingo, milhares de pessoas foram às ruas em várias ilhas do arquipélago canário com o slogan “As Canárias têm um limite”.
Em Maiorca, o grupo Menys Turisme, Més Vida (“Menos turismo, mais vida”) prepara ações semelhantes. Uma manifestação está marcada para 15 de junho.