Elon Musk e Trump: a ofensiva do bilionário contra política econômica do presidente
Crédito, Reuters
- Author, Anthony Zurcher
- Role, Correspondente da BBC News na América do Norte
Durante 130 dias, o bilionário da área de tecnologia Elon Musk foi um “funcionário especial do governo” trabalhando dentro da gestão Trump para cortar o que ele chamava de programas governamentais desnecessários e departamentos inchados.
Agora, depois da sua saída do governo na semana passada, ele está de volta ao lado de fora. E é o governo Trump — e o projeto de lei sobre impostos e gastos que o presidente está promovendo atualmente — que está despertando a ira deste novo Musk, aparentemente sem amarras agora.
Em uma série de publicações nas redes sociais na terça-feira (3/6), ele atacou o projeto de lei central para a agenda de Trump, que está sendo analisado pelo Senado após ter sido aprovado pelos republicanos na Câmara dos Representantes no mês passado. Depois de dizer que não “aguentava mais”, Musk chamou o projeto de lei de “abominação repugnante”.
“Que vergonha para aqueles que votaram a favor disso”, ele disse. “Vocês sabem que erraram.”
E na tarde de quarta-feira (4/6), ele foi além, pedindo aos eleitores que entrassem em contato com seus representantes no Congresso para manifestar sua oposição. “Levar os Estados Unidos à falência não está certo!”, escreveu ele no X (antigo Twitter). “MATEM o projeto de lei.”
A diatribe de Musk contra o projeto de lei apoiado por Trump, que inclui grandes isenções fiscais e mais investimentos na área de defesa, acontece depois que ele passou meses pressionando por cortes nos gastos do governo.
Em suas postagens, o magnata disse que a legislação aumentaria o déficit orçamentário dos EUA, e atolaria os americanos em dívidas. Ele também advertiu os republicanos que apoiaram, ou planejam apoiar, o projeto de lei que “nós vamos demitir todos os políticos que traíram o povo americano” nas eleições de meio de mandato do próximo ano.
E é esta frase que pode ser a mais preocupante para os republicanos.
Na Câmara dos Representantes, todos os membros republicanos, com exceção de três, apoiaram o projeto de lei, que foi aprovado em uma única votação, com oposição unificada dos democratas.
Se Musk se voltar contra a maioria dos republicanos — depois de ter gasto centenas de milhões para apoiar suas campanhas no ano passado —, isso pode causar dor de cabeça para incumbentes preocupados em enfrentar desafios nas primárias do partido, e representar um golpe devastador para as esperanças republicanas de manter o controle do Congresso na segunda metade do segundo mandato de Trump.
Embora Musk tenha feito críticas mais comedidas em uma entrevista na semana passada, esta semana marca uma mudança radical em relação à reunião amistosa que teve com Trump no Salão Oval na última quinta-feira (29/5), na qual ele estava de pé, sorrindo, enquanto Trump expunha a importância do que, segundo ele, seria sua conquista legislativa definidora.
O presidente ainda não respondeu a Musk, mas ele certamente será questionado sobre os comentários. Até o momento, no entanto, a Casa Branca tem lidado com a situação de forma delicada.
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De acordo com reportagens da imprensa americana, a Casa Branca está tentando explicar a oposição vocal de Musk como uma resposta aos cortes dos subsídios à energia verde, previstos no projeto de lei, incluindo créditos fiscais para veículos elétricos, como os carros da Tesla, montadora de Musk.
O site de notícias Axios informou, por sua vez, que outra fonte de tensão é a decisão de Trump de retirar a indicação de Jared Isaacman — um aliado de Musk — para chefiar a Nasa, a agência espacial americana.
Nos corredores do Congresso na quarta-feira, aliados estabelecidos de Trump estavam trilhando um caminho igualmente cuidadoso.
“O projeto de lei pode ser melhorado, mas não é uma abominação”, disse à BBC o senador Lindsey Graham, uma das principais figuras do Partido Republicano e fiel apoiador de Trump.
“Vamos aprovar esse projeto de lei”, ele acrescentou. “Podemos fazer cortes adicionais nos gastos conforme necessário, mas quero marcar alguns pontos. Conseguir os cortes de impostos, torná-los permanentes, conseguir dinheiro, cuidar da fronteira. Mas [Musk] está certo, devemos cortar mais.”
Enquanto isso, o presidente da Câmara dos Representantes, Mike Johnson, teria passado algum tempo rebatendo as críticas de Musk ao projeto de lei em uma reunião a portas fechadas com os republicanos. Ele também tentou tranquilizar os membros do Congresso sobre as ameaças do bilionário de “demitir” os apoiadores do projeto de lei, de acordo com o Politico.
Na terça-feira, a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, disse que Trump “já conhece” a opinião de Musk sobre a legislação. “Este é um projeto de lei grande e belo, e ele está se mantendo fiel a isso”, ela acrescentou.
Trump pode estar apoiando a legislação, mas sua tarefa de convencer os republicanos do Senado a aprová-la só será mais difícil diante da oposição de Musk.
As críticas dele podem encorajar os republicanos linha-dura do Senado em relação ao orçamento, que já estavam manifestando preocupação sobre como o projeto de lei de Trump vai aumentar o déficit federal em trilhões de dólares na próxima década.
Vários deles, incluindo Rand Paul, do Kentucky, Mike Lee, de Utah, e Ron Johnson, de Wisconsin, disseram que não podem votar a favor da legislação da Câmara, a menos que passe por mudanças significativas. Musk tem amplificado um fluxo constante de postagens de Paul e Lee no X, incluindo um artigo com o título “It’s Rand Paul and Elon Musk vs Donald Trump” (“É Rand Paul e Elon Musk x Donald Trump”, em tradução livre).
No entanto, se esses republicanos linha-dura conseguirem o que querem e obtiverem novos cortes de gastos em programas sociais populares, republicanos centristas, como as senadoras Lisa Murkowski, do Alasca, e Susan Collins, do Maine, provavelmente vão se rebelar.
Isso é importante porque, pressupondo uma oposição democrata unificada no Senado, os republicanos só podem se dar ao luxo de perder três dos 53 republicanos se quiserem que o projeto de lei de Trump seja aprovado.
Murkowski não quis se pronunciar sobre o possível impacto dos comentários de Musk na quarta-feira, mas disse à BBC que ele é “um influenciador, e suas palavras têm impacto”.
Livre das restrições do seu cargo quase governamental, Musk jogou um barril de pólvora em todas essas deliberações delicadas para levar as diferentes facções republicanas a algum tipo de acordo — e não é a primeira vez. Suas críticas afundaram um projeto de lei de gastos do governo no ano passado, criando problemas que os republicanos levaram meses para resolver.
Trump disse que quer a legislação em sua mesa para assinar até o recesso do Congresso de 4 de julho. Esta pode se revelar uma tarefa difícil, mas tem um prazo apertado por trás.
Seu “grande e belo projeto de lei” contém um aumento de US$ 4 trilhões no teto da dívida dos EUA. As autoridades do Departamento do Tesouro dizem que, se esse limite não for aumentado até agosto, o país vai enfrentar a perspectiva sem precedentes de inadimplência em sua dívida nacional.
A oposição barulhenta de Musk se baseia, em parte, em seu alerta de que a crescente dívida dos EUA está se tornando insustentável. Mas se suas críticas inviabilizarem os esforços atuais para aprovar o projeto de lei no Congresso, ele pode apressar o dia do acerto de contas financeiro.
Com reportagem adicional de Brandon Drenon