Carla Zambelli: o que acontece após condenação unânime do STF por invasão de sistema do CNJ
Crédito, Bruno Spada/Câmara dos Deputados
Por unanimidade, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) a 10 anos de prisão em regime fechado, à perda do mandato e ao pagamento de indenização, por invadir o sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e por falsidade ideológica.
O ministro Luiz Fux foi o último a votar, nesta quarta-feira (14/5), e completou o placar de 5 a 0 pela condenação.
O relator do caso, Alexandre de Moraes, havia se manifestado na última quinta-feira (9), sendo acompanhado pelos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin e Cármen Lúcia.
Zambelli foi acusada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de planejar e comandar a invasão ao sistema do CNJ com o auxílio do hacker Walter Delgatti, no início de 2023. Delgatti recebeu pena de 8 anos e 3 meses.
A intenção, segundo a denúncia, era inserir alvarás de soltura falsos e até um mandado de prisão forjado contra o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.
Em seu voto, Moraes afirmou que Zambelli atuou de forma premeditada, organizada e consciente, para desacreditar instituições do Estado democrático de Direito.
“Como deputada federal, portanto representante do povo brasileiro e jurada a defender a Constituição, utilizou-se de seu mandato e prerrogativas para, deliberadamente, atentar contra a credibilidade do Poder Judiciário”, escreveu Moraes, ao justificar a aplicação de uma pena mais severa.
A pena imposta à deputada foi agravada, segundo Moraes, pelo comportamento social considerado “desajustado ao meio em que vive a acusada” e pelo “desrespeito às instituições e à democracia”.
O julgamento ocorre no plenário virtual do STF e termina oficialmente às 11h59 desta quinta-feira (15/5). Até lá, ainda que improvável, ministros podem mudar seus votos.
Mesmo com a condenação já formada, a decisão ainda não é definitiva, já que cabem recursos.
O que acontece agora?
Após o fim do julgamento, o STF vai publicar o acórdão — o documento oficial que registra a decisão tomada pelos ministros. Só então começa a contar o prazo para apresentação de novos recursos.
O principal recurso possível nessa fase são os chamados embargos de declaração, que servem apenas para pedir esclarecimentos sobre pontos da decisão que possam estar confusos, contraditórios ou incompletos.
“Os embargos de declaração são um recurso apenas para esclarecimento. Não têm efeito suspensivo nem devolutivo, salvo exceções”, explica o advogado Clóvis Alberto Bertolini, doutor em Direito do Estado pela UFPR e especialista em Direito Público.
Esses embargos não mudam o resultado do julgamento, mas podem afetar detalhes, como a data de início da pena ou o cálculo final da condenação.
No caso da deputada Carla Zambelli (PL-SP), Bertolini afirma que esse tipo de recurso pode ser apresentado, mas não há possibilidade de embargos de divergência, pois a decisão da Primeira Turma foi unânime.
“Diferentemente do que ocorreu com o Fernando Collor, cuja decisão não foi unânime, a condenação da deputada foi unânime na Primeira Turma”, explica.
Zambelli só poderá ser presa e perder oficialmente o mandato depois do trânsito em julgado — ou seja, quando não houver mais chance de recorrer da decisão. Até lá, ela continua solta e com seu mandato de deputada federal, a menos que os deputados decidam antecipar a cassação por conta própria.
A Constituição Federal determina, no artigo 55, que parlamentares condenados criminalmente em decisão definitiva devem perder o mandato.
O texto também diz que essa perda deve ser votada pela Câmara dos Deputados, por maioria absoluta, depois de um pedido da Mesa Diretora ou de algum partido político.
Mas há um impasse entre os poderes. “É uma discussão: a Câmara entende que deveria votar essa perda do mandato. Mas o STF já consolidou há muitos anos que essa perda é automática”, afirma Bertolini.
Segundo ele, o Supremo usa como base o artigo 15 da Constituição, que prevê a suspensão dos direitos políticos após uma condenação criminal definitiva.
“O Supremo tem esse entendimento há tempos e já aplicou isso em outros casos, inclusive em um julgamento relatado pelo ministro Barroso”, diz.
Para o advogado, o provável é que o STF determine que Zambelli perca o mandato automaticamente, como fez em outras decisões semelhantes. “É muito provável que ela perca o mandato após o julgamento dos embargos de declaração”, conclui.
Da mesma forma, a inelegibilidade de oito anos, determinada pela condenação, só valerá quando não houver mais possibilidade de recurso.
‘Perseguição política’
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A defesa de Zambelli classificou a decisão do STF como injusta. Em nota, o advogado Daniel Bialski afirmou que a Corte “desprezou argumentos que levariam à nulidade do processo” e que a deputada foi condenada sem provas “irrefutáveis e induvidosas”.
No X, a parlamentar afirmou ser alvo de perseguição política e disse que a condenação se baseia em acusações sem provas.
“Não há qualquer prova que sustente essa condenação. O que existe é uma tentativa clara de silenciar uma deputada eleita pelo povo, que não se curva diante de abusos de poder”, declarou na semana passada, quando o STF obteve maioria para condenação.
Já Delgatti segue preso desde 2023 por outros crimes cibernéticos, incluindo a invasão de contas de autoridades no Telegram.
Ele é conhecido por seu envolvimento na “Vaza Jato”, quando invadiu contas de autoridades no Telegram, entre elas de integrantes da força-tarefa da Lava Jato e do ex-juiz Sergio Moro, e repassou as mensagens ao site The Intercept Brasil.
No caso atual, ele também deverá pagar, com Zambelli, uma multa de R$ 2 milhões por danos morais e coletivos.
É a segunda vez, em menos de dois meses, que o STF forma maioria para condenar Carla Zambelli.
Em março, os ministros já haviam decidido pela pena de 5 anos e 3 meses de prisão em regime semiaberto, por porte ilegal de arma e constrangimento ilegal, após o episódio em que a deputada perseguiu um homem armada pelas ruas de São Paulo, na véspera do segundo turno das eleições de 2022.
Na ocasião, o julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques.
Paralelamente, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) decidiu, em janeiro, cassá-la por desinformação eleitoral no contexto da eleição de 2022, mas a medida também aguarda o fim dos recursos.